Homilia Domingo de Páscoa

20-04-2025
Foto de Duarte Gomes
Foto de Duarte Gomes

DOMINGO DE PÁSCOA

Missa do Dia

Sé, 20 de abril de 2025

Encontrar a esperança

1. O desespero e o desânimo tinham tomado conta das suas vidas, das suas pessoas. Tudo o que fora entusiasmo, alegria, sonho, projecto de vida (mesmo uma certa percepção da presença de Deus) nascidos à volta de Jesus de Nazaré, tudo se vira transformado em desilusão. Afinal, a morte de cruz — aquela morte reservada aos piores da sociedade — tinha sido mais forte. A esperança morrera para os discípulos naquela Sexta-feira, diante das torturas e do horrível madeiro da cruz… Acrescentada pelo medo de que, também a eles, lhes acontecesse coisa semelhante.

José de Arimateia e Natanael, discípulos até ali em segredo por serem membros do Sinédrio, tinham ganho coragem e pediram a Pilatos autorização para descer da cruz o corpo morto do Nazareno. Por sorte, havia ali ao lado um sepulcro novo: um condenado à morte não podia contaminar os outros sepulcros. Colocaram lá o amigo crucificado. E uma pesada pedra foi rolada sobre o sepulcro. Nem tiveram tempo para completar os ritos. Contudo, o mais importante era que o assunto estava encerrado. Restava regressar a casa e retomar as atividades interrompidas durante aqueles três anos. Para contar aos vindouros, ficariam as ideias, as memórias, a lembrança dos gestos, da ilusão… E, como conclusão, falariam da esperança enganada, do desespero daqueles dias de Jerusalém.

2. Quando tudo parecia concluído, no primeiro dia da semana, o desespero tornou-se ainda maior. Umas mulheres — aquelas que tinham permanecido junto da cruz e que, aquando da sepultura, tinham reparado que as unções não tinham ficado completas — foram ao sepulcro para terminar os ritos… a memória ainda falava, e o coração também.

Chegadas ao lugar, ficaram sem palavras: a pedra que selava o sepulcro tinha sido afastada. Entraram: o túmulo estava vazio. "Roubaram o corpo"… "É preciso dizer a Pedro e aos outros", pensaram e fizeram, mesmo sem saber se servia de alguma coisa: afinal, que podiam uns pobres pescadores diante do Sinédrio ou do Governador?

Assim que lhes chegou a notícia, Pedro e João correram ao sepulcro. Não bastava tudo o que tinha sucedido, quanto agora o roubo do cadáver! João, mais jovem, chegou primeiro. Passados momentos, Pedro chegou também. Entrou, decidido, como sempre. "Entrou no sepulcro e viu as ligaduras no chão e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não com as ligaduras, mas enrolado à parte". Tudo estava como no momento da sepultura. Menos as ligaduras e o sudário, enrolado…

Nesse momento, entrou João, que tinha ficado à espera. Viu o mesmo que Pedro mas, no seu espírito, fez-se luz. Naquele instante, tudo o que Jesus tinha dito e realizado; todos os seus ensinamentos e os seus gestos, por vezes estranhos; tudo o que tinha dito acerca da ressurreição, como naquele dia no Tabor, tudo fazia agora sentido. E tudo se "encaixava" com as Escrituras e com o anúncio que faziam os profetas acerca do Messias e da salvação. Fez-se luz na sua mente, no seu coração, na sua vida! Como não tinha reparado antes?

Agora, "viu e acreditou". A morte de Jesus não fora o fim mas a passagem para um novo princípio, uma nova criação. Jesus não tinha sido vencido pela morte. Ao contrário: vencera a morte! Um rombo enorme tinha sido aberto na muralha da morte que, desde sempre, cercava e limitava a humanidade. Por essa muralha destruída, João podia agora contemplar um outro mundo, um mundo novo, a vida de Deus… muito mais e muito além do paraíso!

Agora, João percebia o que significava ser o Messias: Jesus era, de verdade, o Messias, o Cristo. Mais: era o Senhor, a Palavra de Deus feita carne, que tinha vindo aos seus e que os seus não receberam. Deus feito Homem, para dar a todos a possibilidade de passar, de fazer Páscoa, de viver uma vida não já determinada e limitada pela morte, mas com a certeza, a âncora esperança da vida eterna, no mar da incerteza!

Nesse mesmo momento, desespero e medo ficaram para trás. Agora, a esperança duma nova realidade — uma realidade bem mais real que aquela antes vivida — estava diante dos seus olhos.

3. Naquele momento, João ainda não sabia o que iria suceder nos dias seguintes. Ainda não sabia que o Senhor iria confirmar, dar carne a todas estas verdades em que ele agora acreditava. Ainda não sabia que o Ressuscitado se iria fazer ver a Maria Madalena e, depois, aos Onze. Ainda não sabia que o Senhor se haveria de fazer encontrado por todos na margem do Lago, e que haveria de partilhar com eles mais uma refeição. Sobretudo, João ainda nem supunha como a sua vida seria mudada, transformada para sempre.

E, no entanto, viu e acreditou. Naquele momento, a sua vida deixou de ser simplesmente conduzida por quanto já tinha vivido, pelas conquistas que tinha realizado no passado. E era bem mais que o momento presente: do futuro, surgia uma certeza única, uma realidade maior onde firmar a sua existência, os seus dias, as suas escolhas, a sua liberdade. Podia caminhar com segurança e com determinação ao seu encontro.

Jesus era o Senhor, o Messias — "o Homem", tinha dito Pilatos num dos dias anteriores, sem consciência do que dizia. E era, também, o Deus, o único e verdadeiro Deus, que salvara o povo do Egipto, que fizera surgir David e os profetas, que tinha realizado o regresso de Babilónia. O Deus, com quem ele tinha partilhado a vida naqueles últimos anos, sem se ter dado conta disso.

E este Senhor tinha-o agora envolvido e a toda a sua vida, no infinito horizonte de Deus. João viu e acreditou. A esperança tinha tomado conta da sua existência.

+ Nuno, Bispo do Funchal