Homilia Vigília Pascal

VIGÍLIA PASCAL
Sé, 19 de abril de 2025
"Vigiamos porque esperamos"
1. Esta nossa celebração é, antes de mais, uma vigília. Estamos acordados, vigilantes, como quem espera. Vigiamos porque esperamos: esperamos o Senhor, e esperamos no Senhor. A ressurreição oferece-nos todos os motivos para esperar.
Se lermos com atenção os relatos dos evangelhos, também os discípulos estavam vigilantes quando lhes apareceu a notícia da ressurreição, ao contrário do que sucedera no Jardim das Oliveiras, quando um sono se apoderou deles, e não foram capazes de vigiar com o Senhor (Mc 14,37-41).
Podemos percebê-lo no relato dos discípulos de Emaús. Depois de terem sido acompanhados pelo viajante ao longo do caminho, os dois discípulos disseram-lhe: "Fica connosco porque se está a fazer noite". Contudo, depois que o Ressuscitado partiu o Pão, e eles O reconheceram, não hesitaram: deitaram pés ao caminho, sem olhar a perigos e à noite. Chegados a Jerusalém, encontraram reunidos os Onze, também vigilantes, que lhes disseram: "Verdadeiramente o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão" (Lc 24,33-35).
2. Vigiar é a atitude da sentinela: no meio da noite, procura prevenir os ataques inimigos, ao mesmo tempo que aguarda a luz da aurora, quando o novo dia a tudo oferece visão e segurança.
Mas vigiar é, igualmente, a atitude daquele que quer estar disponível em qualquer momento para o que vai suceder: permanecer acordado é condição para o dia que aí vem. É o nosso estado quando sabemos que uma boa notícia vai chegar, e nem conseguimos fechar os olhos.
Também nós — e os milhões de cristãos que, pelo mundo inteiro, celebram esta vigília — queremos estar vigilantes. E queremos que esta seja a nossa atitude ao longo da vida.
Queremos estar vigilantes sobre o mal e o pecado que nos cercam. Mas queremos, sobretudo, permanecer vigilantes porque a notícia da ressurreição nos impede o sono: a sua luz vence a escuridão; a energia que dela surge impede a tranquilidade do descanso.
Não nos queremos deixar adormecer, correndo o risco de o Senhor vir ao nosso encontro e passar por nós sem O encontrarmos. Não nos queremos deixar adormecer, correndo o risco de o mundo passar por nós e perdermos a ocasião para lhe anunciar a notícia da ressurreição: de Jesus ressuscitado recebemos a missão de cuidar deste mundo que nos rodeia, para o conduzir ao Pai.
3. É a vigília da Páscoa. Uma antiga tradição, de que S. Jerónimo nos dá conta, esperava para uma noite de Páscoa a última vinda do Senhor. Dizia S. Jerónimo: "Do mesmo modo que, no Egipto, o anjo exterminador passou à hora em que foi celebrada a Páscoa, e o Senhor passou por cima das casas cujos lintéis tinham sido consagrados pelo sangue do Cordeiro, assim uma tradição judaica diz que o Messias virá a meio da noite. Estou persuadido que esta é a origem da tradição apostólica que se manteve: na Vigília Pascal, não é permitido despedir o povo que espera a vinda de Cristo, antes do meio da noite. Uma vez passado este momento, tendo sido adquirida a certeza, todos celebram a festividade" (In Matth., IV,25,6).
Hoje, não é ainda o dia da última vinda do Senhor. Mas o anúncio de que Jesus venceu a morte — e que, há momentos, ressoou aos nossos ouvidos — dá ao nosso tempo um carácter diferente: outrora, a humanidade apenas podia desejar, sonhar, com a vida para sempre; depois, a partir do que sucedeu no Mar Vermelho, Moisés e os Profetas podiam entrever uma vitória de Deus e do seu povo. Mas hoje, ao nosso coração, ressoou uma feliz notícia: Jesus ressuscitou vitorioso do túmulo! E este acontecimento do passado oferece ao nosso viver uma garantia de Vida Eterna. Podemos viver a esperança, podemos viver na esperança, podemos ser "peregrinos de esperança".
Numa noite de Páscoa, o Senhor virá: não vem porque é Páscoa, mas será Páscoa quando Ele vier. Virá e, com a sua luz, iluminará definitivamente a vida de todos e do mundo inteiro, e não mais se fará noite. Com a sua Palavra, dará o sentido verdadeiro e definitivo a tudo o que existe e a todos os acontecimentos da história. Seremos, então, julgados pelo amor. Não tenhamos dúvidas: essa primeira palavra da criação será também a última a ser pronunciada.
Agora, Ele celebra connosco a alegria da ressurreição, o seu triunfo primeiro sobre o pecado e a morte. Na alegria de O percebermos ao nosso lado, vivo e ressuscitado, celebremos com Ele os seus sacramentos: eles unem-nos ao momento da sua vitória, e antecipam aquele dia pelo qual esperamos — o dia em que a ressurreição de Cristo colocará um ponto final à transformação do mundo inteiro, de todo o universo.
Até lá, permaneçamos na alegria de quem vigia, para que esse dia não nos apanhe distraídos ou sonolentos; permaneçamos na alegria de quem, vigilante, transforma com a luz da Páscoa tudo o que se encontra a sua volta, o mundo inteiro. Assim, poderemos confiadamente acolher o Senhor quando Ele vier, e escutar dele o convite a participar nas Bodas do Cordeiro.
+ Nuno, Bispo do Funchal